O Plano de acção.


Antes de pôr mãos à obra é mister ter um bom plano. Depois, executá-lo rigorosamente.

A separação da globalidade da produção de Perdido em obras clara e distintamente individualizadas é o foco do plano proposto.

Discutimos esse assunto assíduas vezes. Para ele, interessava-lhe “fazer”, quando e como lhe apetecesse, “e passar à frente”. E rematava, autorizando-me: “Se achas diferentemente, faz o que te aprouver. Por mim, tudo bem! …

Como démarche metodológica, proponho-me iniciar este intento de organização com a produção publicada no Tremontelo, prosseguindo com as obras inéditas em papel e finalizando com a recuperação e transcrição da tradição oral.

À laia de justificação, considero as produções em blogue as suas peças mais terminadas e esmeriladas. Sentia-se muito à vontade no Tremontelo sem o constrangimento de um tema e de um público bem definido e permitia-se a todo o tipo de extravagâncias fazendo o que lhe apetecia, com a extensão e no momento que lhe permitia a sua disponibilidade anímica. “É como no campo, amigo Gervásio. Agora podas os ramos altos das árvores: ficam-te os braços a arder sem sangue nas mãos. A seguir mondas debruçado sobres os canteiros e as leiras: desce-te o sangue aos dedos e à cintura até mais não poderes. No fim, deitas-te no chão e experimentas as carícias do Sol e dos bigodes dos gatos”.

Ao contrário de um livro, o público na blogosfera é anónimo, limitado e directo, podendo o auditório interferir passado um curto instante desde a sua publicação. Perdido gostava muito que interferissem, polemizando. Não o fazendo, fazia-o ele na coisa alheia. Polemizar era um prazer supremo. Como dificilmente encontrava antagonistas, suscitava ódios ou desinteresse e incompreensão. “Vê-me isto, Gervásio. Vêm para aqui com os beijinhos, e mais as queridinhas, e os “ai que beleza, que me tocou no sentimento”, extraíste-me uma nota pungente das cordas do meu coração, e todo o género de marmelada em público e nas barbas da polícia dos costumes. Eu vou lá e digo-lhes: não gostei desta merda. Cai-lhes o verniz e assanham-se como os cães, corporativamente. Gente mole. Onde estão os descendentes das padeiras de Aljubarrota, das patuleias e dos esfola-frades?”. Usava muitas vezes o termo provocação no seu estrito sentido etimológico, “chamamento (ou convocação) para a frente”.

É impossível falarmos de Perdido sem nos dispersarmos. Para ele, “cada frase abre a porta a outra frase” e “às tantas já nem se sabe quantas locomotivas tem a composição”. Voltemos, pois, ao plano definindo os objectivos genéricos:

1. Inventariar o espólio disperso na Internet em sites, grupos, portais, weblogs, comments e chats.

2. Utilizar o espólio da Internet separando-o nas seguintes partes:

  • Concentrar e tratar tudo o que respeita às suas ideias teológicas e místicas (O Monoteísmo e os outros monos).
  • Reorganizar e concluir o ensaio Sobre o Lugar
  • Coligir, comentar e reorganizar os Filosofemas do Bardo
  • Coligir e completar com versões inéditas o Bestiário (Conversas com Gatos, Outros Animais)
  • Reunir a história do Sítio do Tremontelo
  • Organizar os artigos e escritos dispersos sobre saúde, alimentação e vida saudável (Culinária e Bem-estar)
  • Reunir em volume separado os Contos do Juvenal

3. Recuperar os escritos mais antigos e integrá-los nas unidades propostas. Criar mais unidades, quando se justificar.

4. Passar ao papel a memória de muitas conversas nos serões de fim-de-semana no Sítio do Tremontelo (“Bebe mais um cartaxito, Leonel - só me apelidava assim quando estava com um grão na asa - bebe, que te ajuda a desorganizar essa baixa pombalina construída no recôncavo do teu crânio.”).

5. Agrupar todos estes escritos em dois volumes – um filosófico e místico, outro “mais ou menos” literário.

6. Estruturar e redigir a sua obra magna, o grande esforço de toda a sua pesquisa, a História Natural da Cultura, obra mais imaginada do que escrita, que “envolve também a análise das bricofichas do AKI como veículo de circulação mimética”, como ele gostava de acrescentar sempre que se falava genericamente desta gigantesca conceptualização darwinista da Cultura.

Ficam por detalhar estes objectivos, definir as macro-tarefas do projecto e estimar os recursos necessários. A metodologia, vamo-la aos poucos refinando.


Espero, desta forma, desempenhar-me bem da espinhosa missão de que fui incumbido.

1 comentários:

bettips disse...

Nem o Marquês de Pombal objectivaria melhor! Os meus cumprimentos.